segunda-feira, junho 05, 2006

Perfume de Canela

O despertador tocou, acordava para um novo dia. O sabor da vida não era igual ao de antigamente, não estava amargurado, apenas aborrecido. Queria conhecer o mundo, saborear todas as culturas, deixar-me levar pelas suas loucuras e rituais, banhar-me nas águas de todos os seus mares. Andava um pouco à deriva, o meu rumo estava de momento estagnado, a emoção de outros tempos dera lugar a uma desagradável monotonia. Por outro lado, os meus amigos estavam em segurança, eu sentia-me em segurança, nenhum louco mais nos perseguia, o perigo desaparecera dos nossos dias. Ainda neste mesmo momento que recordo com saudade as fugas perdidas por mato fora, os amores corrompidos pela infidelidade, os doces lábios da Elsa e todos os licores que saboreei e no meu próprio fígado destilei, neste e noutro Continente.
Passara mais de um mês desde que tudo terminara, a vida retomara o rumo natural da monotonia. O fugaz perigo desaparecera comigo, o Zé e mais duas amigas numa cabana de caçadores perdida no meio de um bosque enquanto o último vestígio da memória sórdida do Heitor era finalmente apagado do destino da minha vida. Não lhe havia sido reservado grande sorte, o seu irmão Miguel morria em fuga à policia, de embate violente contra uma cabina de portagem da Ponte Vasco da Gama, destruindo por completo o seu jipe e a vida dos seus capangas, sem glória nem perdão. De certa forma pagou pelos seus crimes, tal como o seu irmão Heitor, terminando de forma prematura uma vida repleta de excessos e que se resumia agora, esquecidamente, a palavras de ocasião escritas numa lápide de adorno.
Eram quase sete da tarde, perdera-me a vaguear nu pela casa e esquecera-me por completo do que tinha combinado para aquela noite. Uma das amigas retidas na cabana, a Emiliana, mantivera o contacto permanente comigo e naquela noite iríamos à inauguração de uma discoteca junto da praia do Guincho. A Emiliana tinha arranjado convites para nós e para uma outra amiga que levaríamos.
Abri a torneira e deixei a água correr, aquele banho era sem duvida muito apreciado e desejado mas faltava algo, um pouco de cor. Enquanto a banheira enchia, servi-me de um copo de Porto, eram momentos daqueles que importavam, seria do sabor doce nos lábios que mais tarde recordaria, o corpo a aquecer, do novo animo que me tomava lugar. A água estava quente, acompanhado pela garrafa, mergulhei e por ali fiquei, suando e servindo-me do néctar.
O telefone tocou, abri os olhos como se tivesse acordado pela primeira vez naquele dia já longo, a garrafa de Porto vertia para o chão e um copo de cristal flutuava junto dos meus pés. Levantei-me em sobressalto, a água estava fria e o vinho não mais aquecia o meu espirito. O telemóvel tornava a tocar, embrulhei-me depressa numa toalha. Era a Emiliana.
Então? Não vens?! – perguntava ela.
Vou... Espera, que horas são?
Horas?! Já passa das dez, ficaste de aparecer na minha casa às nove.
Desculpa, devo ter adormecido.

E tinha mesmo adormecido, na banheira, enfrascando-me em vinho do Porto. Desliguei o telefone e tratei de me aprontar, a amiga da Emiliana já estava na sua casa e quando chegasse iríamos logo para a praia do Guincho.

As luzes, os carros finos da região, as betas da Quinta da Marinha e os seus papás faziam fila para entrarem no novo monumento ao bom gosto artístico e criativo da noite. Acabáramos de chegar à Nieuwe Maas, uma discoteca construída sobre as rochas cadentes para uma das praias ao lado do Guincho, estava linda, as cores violetas, as folhas verdejantes e o glamour tornavam o local atractivo e especial. A amiga da Emiliana vinha de tirar o fôlego a qualquer pobre transeunte, fiquei agradado com a surpresa. Facilmente, e estranhamente, passámos toda aquela fila de queques e meninos ricos com as chaves do Porsche do pai fora da algibeira, éramos chamados ao longe por um dos gorilas que seguravam a entrada da discoteca.
Mal entrámos no deslumbrante sitio, fomos abastecidos com champanhe que diversas assistentes serviam aos convidados. Uma amiga da Emiliana foi ter connosco, bastante atraente e com um corpo sensual. Menos volumosa que a Ana, mais elegante e explosiva. Chamava-se Mara, tinha a nossa idade.
Depois de alguns instantes a vaguear pela discoteca, parei junto do bar. A Emiliana e a amiga Ana ficaram nos sofás, a Mara seguiu-me, deveria precisar de uma bebida. A bela desconhecida sorria, nada dela sabia, apenas o corpo lhe tentava conhecer. O seu vestido curto e elegante deixava-me explorar visualmente grande parte da sua pele, imaginar o resto das suas formas escondidas. Fiquei estupidamente excitado, babava-me no bacardi que bebia e ela pedia uma vodka para ela.
Falávamos de tudo e de nada, a Emiliana continuava sentada no sofá, enquanto as bebidas chegavam sem contagem à nossa ponta de balcão. Não pagava nada, os meus pedidos eram aceites e não registado, talvez fosse cortesia da casa por estar ali sentado com uma rapariga tão bonita.
A doce Mara pediu uma nova rodada...
Estás a ver se me embebedas? – perguntei eu, sorrindo.
Eu?... Bem, talvez. – disse ela, retribuindo o sorriso.
Não esperava que fosse tão directa, peguei no copo e voltei a molhar os lábios no licor oferecido. A pequena tentação continuava ali sorrindo, com o seu copo na mão e ajeitando de vez em quando o seu delicioso decote. Já tinha lançado a primeira pedra na construção de um engate para aquela noite, não poderia ficar-me pelos alicerces e quis jogar forte.
Talvez seja o bacardi a falar, quem sabe, o meu coração, mas... tu és linda.
Ela sorriu.
Apetece-me levar-te para o banco de trás do meu carro e fazer amor contigo.
O sorriso na cara da Mara dissipou-se, os olhos da bela rapariga ficaram fixos nos meus, sem reacção. Desviei o olhar, peguei no copo e dei um forte gole no licor.
Interessante, o teu desejo. – reagiu ela.
Antes que eu pudesse dizer alguma barbaridade mais, a Mara pegou-me suavemente na mão e arrastou o meu corpo com ela.
Vem comigo, tenho uma ideia melhor.
Seguimos na direcção de uma porta fechada que dava para uma saída exterior. Antes de sairmos do bar, ela pediu uma garrafa de champanhe e dois copos. O barman piscou-lhe o olho, algo de estranho se passava.
Champanhe?
Ui, vivemos bem por estes lados.
– disse-lhe ironicamente, enquanto caminhávamos.
Ela nada disse, continuava a prender a minha mão e arrastava-me para a porta. Estava fechada, pronto, pensei que fossemos ficar por ali, mas a Mara tinha a chave que a abria e desvendou uma beleza imensa. Era uma pequena praia privada, fechámos a porta trás de nós, aquele local seria só nosso. As areias eram iluminadas por uma fraca luz de presença pendurada na parede da discoteca sobre a porta e as estrelas que nos serviam de tecto. Enterrámos os nossos pés naqueles sedimentos, caminhávamos de mãos dadas para mais perto do mar, a Lua e as ondas salgadas de embate nas rochas naturalmente dispostas faziam-nos companhia. Ali estávamos isolados de toda a confusão que nos perseguia minutos antes, tínhamos uma pequena praia privada só para os nossos caprichos.
Sentámo-nos na areia, o champanhe foi servido, continuava estupefacto com tal cenário criado, com o que a Mara tão facilmente havia feito e derretido com a sua maneira meiga de tirar as alças do seu vestido. O champanhe foi servido dentro dos copos mas apenas um gole foi saboreado, o restante repousava nas areias da praia, o desejo era intenso, os copos caíram tão facilmente como o vestido, ao primeiro beijo trocado. Pouco tempo depois, o mesmo havia deslizado por completo do seu corpo de pele de pêssego, umas finas cuecas lhe abrigavam do meu desejo louco e incessante que crescia a cada momento que passava, a cada toque nos seus seios, a cada onda que na praia rebentava, a cada beijo com os seus lábios trocado.
Fizemos amor, lentamente, intercalando suspiros com festas, beijos de paixão e palavras de galanteio. A porta da discoteca permanecia fechada e cerrada atrás de nós, a praia continuava a ser apenas nossas.
Tinha uma dúvida por esclarecer, como seria possível estar a viver aquele momento, naquele local. A Mara contou-me que era Relações Publicas da discoteca Nieuwe Maas, daí toda a facilidade na elaboração e execução do jogo de sedução que conduziu os nossos corpos àquele desfecho.
Acabámos por beber o resto do champanhe pela garrafa, dividindo goles com beijos e quando parecia estar nas últimas gotas, despejei lentamente o néctar sobre os seios da Mara e de lá bebi, passando e enrodilhando suavemente a língua naqueles montinhos quentes e húmidos.
O tempo foi passando, o champanhe esgotando, os nossos corpos abraçados o mar escutando.
Que queres mais para esta noite? – perguntava a doce Mara.
Não sei, minha querida. Surpreende-me.
A doce sedutora tinha algo mais em mente, vestiu o seu vestido e foi ao interior da discoteca. Pediu-me que esperasse por ela, que não fugisse para lugar algum. Pouco tempo depois regressou, vinha sorridente e trazia uma lanterna na mão. Acendeu-a e a apontou para umas rochas junto do mar, nada mais via a não ser água e pedra. Descalçou as suas sandálias e subiu um pouco do seu vestido justo ao corpo, agarrou-me da mão e entrámos no mar. seguimos junto às rochas, algumas conchas estalavam debaixo dos nossos pés, pensei que me levasse a dar um mergulho, mas segundos depois apontou a lanterna para uma entrada esculpida nas rochas.
A maré estava baixa, só assim conseguimos lá entrar. O espaço tinha no seu interior luz artificial, espreitando com insistência para dentro da caverna via-se uma luz verde fluorescente que iluminavam alguma coisa, no entanto, seria perfeitamente imperceptível para quem desconhecesse tal recanto. A menina sabia as rochas que pisava e os passos que dava, o mar ficava-se pela entrada da gruta, o caminho dali adiante estava acima do nível do mar. As paredes estreitas alargavam-se numa questão de poucos passos e abriam caminho para uma pequena câmara. Não mais era necessário a luz da lanterna, estavam dispostas pelas rochas algumas velas que a Mara se encarregava de acender e no tecto cavernoso estavam uma película verde luminosa. O acender do rastilho das últimas velas desvendou outra maravilha, uma pequena piscina natural, semelhante a um jakuzzi, formada no solo da gruta e enchida pela água do mar.
Desta vez não havia champanhe nem o glamour de uma noite passada ao luar, mas as velas de canela que nos iluminavam e aromatizavam o interior da gruta serviam de catalisador para mais uma troca de fluidos, uma cena de paixão. As nossas roupas molhadas depressa saíram dos nossos corpos suados, entrámos na piscina, a água estava fria mas depressa aqueceu com o nosso calor, trocámos caricias, explorámos desejos pouco desvendados.

A maré subia lá fora, o barulho das ondas nas rochas que nos abrigavam não interrompiam o nosso momento de sedução. Alguns lençóis de água formavam-se no chão pedregoso da nossa caverna, nada que nos preocupasse de momento, a maré ainda teria de subir mais um metro até nos tapar a saída e estragar a fantasia.
Escutámos chapinhar na água dentro da gruta, alguém vinha ter connosco. Era a Ana, a amiga que tinha vindo comigo e com a Emiliana. Estava linda, despira as calças de ganga para atravessar o mar que nos separava, vinha apenas com uma blusa vestida e umas cuecas brancas, agora transparentes pela água salgada.
Meninos, desculpem aparecer aqui... - dizia ela, olhando para todos os lados da caverna excepto para nós.
Nem sabia que lhe dizer, estava um pouco envergonhado por ela ter aparecido ali. A Mara também nada disse, não parecia constrangida e muito menos surpreendida.
Têm pouco tempo, daqui a uma hora a gruta deve estar inundada.
A minha mente perversa há muito que havia despido completamente a bela Ana, aquelas roupas molhadas jogadas às rochas e fantasiava com ela partilhando o nosso ninho de amor. Minha nossa, como esta rapariga era mesmo boa!
A Mara notou de imediato a brusca alteração do meu estado de espirito, as suas mãos delicadas voltaram a mergulhar na água da nossa piscina e estimularam os meus sentidos. A Ana tinha chegado com um aviso ao nosso esconderijo, agradavelmente descoberto, não parecia assustada, permanecia ali diante de nós, agora observando-nos. Mordeu o seu lábio, as usas mãos tinham caído para as suas coxas como se as massajassem, a sua língua humedeceu os lábios levemente... Foi o suficiente para fazer crescer em mim um desejo descomunal de a querer possuir, tomar o seu corpo no meu colo e explorar cada detalhe.
Tinha sido bem saciado pelo intenso calor da doce Mara, mas uma vontade diferente regia os meus sentidos. Beijei o pescoço da Mara, mordi a ponta da sua orelha e sussurrei-lhe ao ouvido que convidasse a Ana para se juntar a nós. Ela não precisou de falar, bastou uma troca de olhares e um sorriso entre elas para que a Ana despisse a sua blusa e retirasse lentamente as cuecas. Veio na nossa direcção, mergulhou sem pressas na água, estava fria para ela. Seguiram-se os beijos, o agradável tactear das minhas mãos nos seus seios e os seus lábios percorrendo o meu corpo. As velas continuavam acesas, a cera quente cheirava a canela, deitei cera líquida nos seus da Ana, ela adorou, suspirava com mais intensidade. Ela ficara quente, o seu calor tomara conta de nós três.
Perdemos a noção do tempo, estávamos satisfeitos, deleitados e com os nossos corpos exaustos. A água do mar tomava conta da nossa caverna, a maré aproximava-se rapidamente da cota máxima que poderíamos ainda habitar na gruta. Pegámos nas poucas roupas que leváramos ali para dentro, o resto estaria na praia e fomos depressa para a entrada daquele recanto encantado. Tínhamos água quase pelo nível do pescoço, eram uma zona sem rebentação de ondas, facilitando o caminho de regresso à civilização. O Sol começava a nascer, ainda subia lentamente pela margem do horizonte, despegando-se do mar e subindo para os céus. Os tons de laranja coloriam a nossa recém chegada manhã.
Voltámos à praia, onde tudo horas antes tinha começado. O percurso parecia mais curto, agora com pouco mais que apenas uma Lua nos indicando os passos a dar. Uma dezena de metros separavam-nos da entrada da gruta, local muito apetecido e de boas recordações recentes que ainda saboreávamos.
O Sol continuava a erguer-se, sentei-me na areia da praia, cheirava a suava brisa da manhã, via ao longe a beleza do nascer de um novo dia na companhia de duas elegantes mulheres. Foi bom, foi diferente, perdura a sensação.

4 Comentários:

Anonymous Anónimo disse...

Mto boa !Adorei!Diferente das outras... uma lufada de ar fresco nas histórias!Mto romance...:D Para quando a próxima? :P
Beijokas ***

1:11 da manhã  
Blogger p1ngger disse...

muito boa. está entre as melhores que ja escreveste =)

7:12 da tarde  
Anonymous Anónimo disse...

A sensualidade anda na tua emnte e na ponta dos teus dedos

7:31 da tarde  
Anonymous Anónimo disse...

Escreves tão bem...estou deliciada com as tuas histórias...

12:07 da tarde  

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