quinta-feira, abril 15, 2004

Paixão armadilhada

Estava um Sol radiante lá fora, acordei bem disposto.
Eram quase seis da tarde, tinha acabado de me levantar da cama e fui directo para o banho.
Ainda tinha no corpo as marcas da noite anterior passada com ela, o seu cheiro estava bem presente na minha pele e os seus gemidos ainda ecoavam nos meus ouvidos.
Quando cheguei novamente ao quarto, pequei no telemóvel, tinha recebido uma mensagem da Patrícia.
Adorei a nossa noite, apetece-me reviver aqueles momentos contigo.
Tinha pensado numa outra surpresa para ti, passa em minha casa por volta das sete da tarde.
Beijinhos, Patrícia

Não faltava muito para as sete, não dispunha de muito tempo para me arranjar mas consegui chegar a tempo a casa dela. Estacionei o carro à porta do seu prédio e esperei que ela descesse.
Patrícia vinha muito elegante, trazia vestida uma saia curtinha e uma t-shirt cheia de estilo. Desta vez a surpresa era outra, consigo tinha também descido a sua irmã. Era a mesma rapariga que na noite anterior tinha brincado comigo no Portão, gozando com o meu estado de embriagues.
A Diana era bonita como a irmã mas tinha uma beleza diferente, mais angelical e menos exótica que a da Patrícia. Os seus doces olhos castanhos fixavam-se nos meus e ela sorria discretamente, certamente estava a lembrar-se das palhaçadas que fiz na última vez que me viu.
Cumprimentei a Diana e entrámos no carro.
Parte da surpresa era um jantar em Lisboa, fomos então para lá. Durante a viajem, olhei várias vezes pelo espelho retrovisor, não para observar a estrada mas sim a carinha bonita da irmã da Patrícia, após tanto tempo a vê-la no bar, tive agora esta oportunidade de aproximação e pensava eu...
Finalmente te conheci, tanta punheta bati a pensar em ti.
Estava realmente contente com esta nova surpresa reservada por elas para esta noite.
Chegámos ao restaurante, a Patrícia tinha feito uma reserva no Bom Jardim, situado nos Restauradores.
A comida estava óptima e quando saímos do restaurante, vagueámos um pouco pelas ruas da zona.
Patrícia tirava-me fotos e à irmã, ficou tão encantada com uma montra de ourivesaria, ali mesmo ao lado do restaurante, que nos mandou pousar para mais de vinte fotos, de todos os ângulos imaginários.
Fizemos a digestão e demos um saltinho nas Docas.
Entrámos sem qualquer dificuldade no Queens’ apesar da discoteca estar a abarrotar, ia bem acompanhado por duas beldades e todos os olhares dos rebarbados punheteiros presentes se centraram na minha companhia.
Fiquei contente comigo próprio, enquanto eu passeava com elas para todo o lado, o máximo que eles faziam era olhar e memorizar cada contorno dos seus corpos para mais tarde recordar na mítica punheta de vaza colhão.
A música estava boa e o ambiente era agradável, a nossa noite prolongou-se até bem tarde e chegámos a casa depois das oito da manhã. Despedi-me das meninas e fui dormir um pouco.

Acordei novamente de tarde, falhei o almoço em família.
Comi sozinho o resto do borrego que tinham guardado para mim, dentro do microondas. Estava ainda apetitoso mas em nada se comparava à carne tenrinha da Patrícia. Ainda sentia o seu cheiro no meu corpo, o elegante contorno das suas curvas permanecia na minha mente e animavam a minha imaginação, não sosseguei até acabar de esgalhar o pessegueiro.
Tudo entre nós estava a desenrolar a um ritmo demasiado acelerado mas as fodas tinham sido boas e sentia uma enorme atracção por ela. Não estava habituado a tanta convivência seguida com a mesma mulher.
Fiquei um pouco apreensivo devido à elevada velocidade que a nossa relação vai evoluindo, mais três dias neste ritmo e isto ainda é coisa para dar em casamento. Tentei não pensar nisso, não me queria desgraçar ainda tão novo.
Não havia qualquer motivo para alarme, a bela Patrícia tinha-me conseguido levar para a cama, não para o altar.
A tarde passou a correr, quando olhei para o relógio eram horas duma nova refeição.
Acabei de jantar com a minha família e fui buscar a menina a casa.
Tínhamos combinado uma saída em Lisboa, na discoteca Lux mas demos um saltinho no Portão.
Os meus amigos aguardavam-nos lá, tal como a Diana.
O bar estava bem frequentado, para um Domingo de Páscoa.
Subi para o primeiro andar, acompanhado pela Patrícia, onde eles nos esperavam.
O Alexandre entretinha-se com um copo de cerveja na mão, o Zé aproveitava uma vez mais o facto de não ter a namorada por perto e tentava lançar algum charme sobre a Diana, esta sorria e consentia um pouco daquela aproximação. Ao canto do sofá, encontrava-se o Luizinho a tentar seguir os passos do Zé mas dirigindo os seus esforços na direcção da Vera. A ruivinha não sorria como a Diana e pela sua expressão de desespero, já não deveria estar a gostar muito da brincadeira.
O pobre Luizinho estava determinado a levar a sua avante e batia-se mais que a gasosa.
Naquela noite, somente tínhamos ido ao bar para tomar uma bebida e trocar dois dedos de conversa.
A Diana olhava agora para mim de maneira bem diferente daquela no dia que nos conhecemos, há duas noites atrás, ali naquele mesmo bar. A saída na noite anterior tinha sido produtiva e serviu para quebrarmos o gelo entre nós, ela agora via-me como um amigo e sentia que tinha a sua aprovação para namorar com a irmã.
Acabámos a bebida e despedimo-nos deles.
Diana também levantou o seu vistoso rabo do sofá e acompanhou-nos até à saída. Ela tinha trabalho no dia seguinte e aproveitou a nossa boleia para sair dali, talvez também ela farta dos avanços indiscretos daqueles rebarbados.
O seu carro estava estacionado ao lado do meu, junto à entrada para o bar.
Trocámos dois beijos de despedida e entrei no carro. A Patrícia ficou por momentos à conversa com a irmã, entrou depois no carro.
Algo a inquietava, aquelas últimas palavras trocadas com a Diana alteraram o seu estado de espírito.
Que foi, doçura? – perguntei-lhe eu, reconfortando-a.
Agarrei depois na sua mão que me estava mais próxima e dei-lhe um beijo.
Nada, querido. Anda, vamos para o Lux. – disse ela.
Fomos então directos para Lisboa, o Lux aguardava-nos.
Chegámos à discoteca, passavam alguns minutos da meia-noite e o aglomerado de pessoas para entrar naquele cantinho de estrelas e beldades era cada vez maior.
Entrámos sem qualquer dificuldade, a Patrícia, com aquela carinha, entrava em qualquer lugar e eu, por arrasto, aproveitava a boleia.
Pedimos duas bebidas para aquecer a tripa, tomávamos as nossas bebidas ao lado de algumas celebridades do panorama televisivo nacional mas a estrela mais radiante daquela noite era a minha querida Patrícia, chegando a ofuscar a bela Marisa Cruz que bebia o seu Martini, dois sofás ao lado.
Deixámos as bebidas para segundo plano e deliciávamo-nos com o sabor dos nossos beijos e aquecíamos os nossos corpos com suaves carícias. Perdemos completamente a noção do tempo, tinham entrado mais pessoas na discoteca e o som na pista já era apreciável.
Começou a tocar uma música mais apropriada ao ritmo dos nossos desejos, dançávamos agora bem colados um ao outro, sentindo assim a respiração de cada um. Nada nos faria parar, seria dançar até rebentar.
As horas foram passando e nós dançando.
Patrícia olhou para o relógio e disse-me que se sentia cansada.
Entretanto a música rabeta tomou conta da pista, a Patrícia insistiu comigo para que fossemos embora.
Estávamos somente ali há três horas mas eu próprio tinha alguma vontade em sair dali.
Saímos do Lux e ficámos a conversar no carro, a pedido da Patrícia.
Abraçámo-nos, trocámos uns doces beijos e iniciámos então o caminho de regresso a casa.
João, passa naquela ourivesaria onde estivemos ontem. – pediu-me ela.
Está bem, viste lá alguma coisa que te interessasse? – perguntei eu.
Sim, uns brincos para oferecer à Diana. – disse ela, após alguma hesitação.
Estávamos a passar perto do Terreiro do Paço, era relativamente perto até à ourivesaria. No entanto, era um pouco tarde para irmos ver montras mas fiz-lhe a vontade, em cinco minutos chegámos lá.
A ourivesaria ficava numa ruazinha perpendicular à avenida da Liberdade, no lado oposto à Loja do Cidadão.
Parei o carro junto à entrada para a estação de Metro nos Restauradores, ela pediu-me para manter o motor a trabalhar, que não se demorava.
Espera, vou só ver o preço e levantar dinheiro no Multibanco. – disse Patrícia.
Ela saiu do carro e virou a esquina.
Passaram dois minutos e a Patrícia ainda não tinha regressado, eram três da manhã ela ali sozinha na rua.
Ouvi o som de um alarme proveniente da rua onde ela estava. Fiquei preocupado, talvez estivessem putos a roubarem carros naquela zona e a minha doçura encontrava-se ali no meio da confusão. Saí do carro para ver o que se tinha passado, assim que fechei a porta do carro, vi a Patrícia correndo na minha direcção, agarrando ferozmente a sua mala.
Entra no carro, João!
Temos de sair daqui... rápido!
– gritava ela.
Entrei no Astra e arranquei a toda a velocidade, deixando um rasto de borracha queimada.
Não lhe perguntei o que se tinha passado, pensei de imediato que alguém a estivesse a perseguir.
O som do alarme dissipava-se à medida que nos afastávamos daquele local mas havia agora que contar com um novo ruído, as sirenes dos carros da polícia. Apreensivo e sem saber merda do que se estava a passar, quis saber mais coisas.
Que se passou ali atrás? – perguntei-lhe eu.
Anda, João! Depois eu explico-te... – respondeu ela.
Não, foda-se!
Diz-me porque é que temos a polícia atrás de nós ou paro já a merda do carro.
– insisti eu.
Coloquei a mão no travão de mão e fiquei a aguardar por uma resposta sua.
Por favor, João...
Eu conto-te tudo mas tens que os despistar primeiro.
– acrescentou a Patrícia.
Vinham dois carros da polícia a menos de cem metros de nós, a avenida era larga e tentei esticar ao máximo as rotações do motor, para os despistar. A Patrícia suava um pouco e eu que nem um porco, não estava habituado a estas loucuras. Ela olhava constantemente para trás e pedia-me que acelerasse mais.
Iria tentar apanhar a ponte Vasco da Gama, seria o melhor destino fugindo dali.
Saí da avenida da Liberdade, temia que mais carros da polícia se juntassem na perseguição.
Não sabia porque fugia à polícia, somente fazia o que achava mais correcto na altura, tinha como única preocupação proteger a rapariga que eu adoro e tanto gosto.
Olhei pelo espelho retrovisor, continuavam os dois carros da polícia no meu encalço, olhei novamente e apenas um me seguia, um dos carros não tinha aguentado uma manobra perigosa a alta velocidade, mais arriscada, e espetou-se num camião do lixo que efectuava a recolha nocturna. Espero que não tenha havido males maiores e que tudo não tenha passado de chapa batida mas o embate foi bastante violento.
Patrícia estava extremamente excitada com esta fuga à polícia e agora sorria para mim. Tinha que despistar este último carro que me perseguia, abrandei um pouco e esperei que ele se aproximasse da traseira do meu Astra.
Que se passa? Porque abrandaste? – perguntava ela, alarmada.
Espera, já vais ver... – disse eu.
Aguardei que o polícia se colocasse a menos de um carro de distância do meu, acelerei então a puxar pelo máximo do motor, numa mudança baixa. O carro da polícia acompanhou o andamento do meu, tal como esperado, seguia agora colado a mim, a uma velocidade cada vez maior numa rua estreitinha na Alameda.
Os carros seguiam colocados, a Patrícia estava impaciente e bem agarrada ao assento, nunca perdendo de vista a sua mala que trazia a razão pela qual estávamos agora a ser perseguidos pela polícia.
Não vinham carros na outra faixa de rodagem, era a minha oportunidade para escapar.
Guinei completamente o volante para a esquerda, reduzi a caixa de velocidades para primeira e puxei o travão de mão com toda a força. O carro rodou sobre si, o motor quase que rebentava devido à brusca redução de caixa mas consegui assim bloquear as rodas e fazer o carro inverter a marcha.
Por pouco que o carro da polícia não me entrou pela traseira do Astra a dentro, este passou-me a toda a velocidade e só conseguiu travar muitas dezenas de metros à frente. O agente pouco mais tinha a fazer, caiu no engodo que lhe tinha preparado.
Aproveitei-me bem da largura da avenida de Roma para fazer esta manobra que não lembra a ninguém. Estava agora na faixa contrária de rodagem, invertido em relação ao andamento do carro da polícia, consegui evitar que ele me apanhasse mas não evitei a colisão num outro carro que se encontrava estacionado, na berma.
O embate abalroou todo o lado direito do Astra, a Patrícia magoou-se no braço mas alegrou-se quando viu o carro da polícia a uma distância considerável, já muito dificilmente nos alcançaria.
Pelo retrovisor, ainda observei as luzes azuis e vermelhas e piscarem mas meti prego a fundo no acelerador e desviei para uma ruela transversal à avenida de Roma e mais tarde apanhei a Segunda Circular que nos levou directos à ponte Vasco da Gama.
Finalmente tínhamos conseguido desviar as atenções da policia, viajávamos agora em plena ponte mas do susto não nos livrámos e o meu carro trazia com ele o resultado final daquela louca perseguição.
Tenho o lado direito do carro todo fodido, espero que tenhas uma boa desculpa para o que acabou de acontecer. – disse eu, com uma certa pena pelos danos sofridos.
Acho que isto paga muitas desculpas... – respondeu ela, abrindo depois a sua mala.
Na sua mala de pele, estava contida uma pequena bolsa preta de veludo.
Patrícia abriu a bolsa e retirou de lá uma pequena pedra brilhante, de entre muitas, parecia-me um diamante.
Que trazes aí? – perguntei eu, incrédulo.
Aquilo era a razão de toda esta confusão...
São diamantes, João.
Pensa naquilo que podemos fazer com eles.
– acrescentou ela.
Eu estou bem assim, obrigado.
Não preciso dessa merda para ser feliz.
– disse eu.
Estávamos a passar próximo da área de serviço que fica no fim da extensão da ponte Vasco da Gama, ela pediu-me que parássemos lá sem falta. Hesitei de início, já deveria haver um mandato de captura ao nosso carro e aquela zona era patrulhada por brigadas de trânsito.
Acabei por ceder às pretensões da Patrícia, abrandei a marcha e entrei na área de serviço. Esta menina sabe ser bastante persistente e fá-lo de uma maneira que nenhum homem consegue resistir.
Toda aquela adrenalina da fuga e os sensuais toques da Patrícia, levaram-nos a esquecer o que se tinha passado minutos antes. Estacionei o carro no parque, pouco concorrido para aquela hora, ainda nem quatro da manhã eram.
Estávamos cheios de tesão, Patrícia despiu-me o pólo que trazia vestido e os seus lábios colaram-se nos meus. A nossa excitação aumentava a cada momento passado e iríamos fazer amor ali.
Desapertei o fecho das calças e esperei que ela tratasse do resto, enquanto eu lhe beijava o pescoço e passava as mãos pelas suas costas. Ela recostou-se no banco, mexeu no telemóvel e voltou a abraçar-me.
Estava com uma tesão do caralho, capaz de partir pedra à caralhada.
Patrícia fez deslizar uma mão para dentro das minhas calças e tocava-me na gaita.
Fomos subitamente interrompidos, dois gajos tinham acabado de entrar dentro do nosso carro.
Não podia acreditar que esta merda me estivesse a acontecer novamente.
Desta vez não sabia como reagir, um deles apontou uma pistola à cabeça da Patrícia e mandou-me sair dali rapidamente. Mal tive tempo de apertar o fecho das calças, levei com o cano da arma na cabeça e fiquei todo fodido com aquela merda.
O outro cabrão, sentado por trás do meu banco, estava extremamente calmo e ainda não tinha dito nada.
Estávamos novamente na auto-estrada, o cabrão que tinha a arma na mão deu-me indicações para me dirigir a uma fabrica abandonada, na zona industrial da AutoEuropa, em Palmela. Fiquei assustado e temi pelas nossas vidas, nenhum ladrão de carros nos levaria para um recanto daqueles, longe de toda a civilização, somente com a auto-estrada A2 por perto.
Chegámos finalmente ao local indicado pelo bandido.
Pára aqui! – gritou ele.
Saímos todos do carro, pensei que nos fossem abandonar ali e fugissem com o automóvel mas tal não aconteceu. O gajo que até ali tinha estado em silêncio, deu-me um murro no estômago e mandou-nos entrar dentro da fábrica.
Havia pouca luminosidade na zona e certamente ninguém mais por perto.
A tal fábrica era agora um armazém de entulho e a única luz que iluminava as suas paredes, provinha dum candeeiro na rua, junto à estrada de acesso. Era um sítio arrepiante, no meio da fábrica estavam duas cadeiras, dispostas lado a lado. Certamente aquilo tudo tinha sido uma acção planeada, temia agora mais que nunca pelas nossas vidas.
Coloquei discretamente a mão dentro do bolso das calças, tinha lá o telemóvel e fiz uma chamada para o Alexandre. O gajo deveria ainda estar no Portão com o Zé, depositava neles as minhas últimas esperanças.
Senti uma leve vibração do telemóvel, a chamada tinha sido interrompida.
Talvez o cabrão do Alexandre estivesse com os copos e pensou que eu estivesse a gozar com ele.
Fiz novamente a chamada e esperei que tivesse melhor sorte desta vez.
Um dos bandidos abordou-me, pegou em mim pelos braços e atou-me a uma das cadeiras, com uma corda de alpinismo. Depois de me amarrar firmemente, teve o mesmo procedimento com a Patrícia e retirou-lhe a mala que ela trazia, despejando depois todo o seu conteúdo no chão.
Desta vez a chamada ainda se mantinha em linha, pelo menos não me tinha dado conta que tivesse sido interrompida. Confiando que eles me estariam a ouvir, tentei fornecer-lhes o máximo de indicações possíveis relativas ao local onde estava e nas condições em que me encontrava.
Oiçam... Porque é que nos raptaram para esta fábrica abandonada?
Aqui na AutoEuropa... Vocês os dois estão armados.
Por favor, não nos façam mal!

Disse e repeti aquelas palavras em voz alta, na direcção dos bandidos mas querendo que o Alexandre as escutasse e entendesse. O Zé estaria naquele momento ao lado dele, o seu pai é polícia e ele já deve estar habituado a este tipo de coisas, desejava eu que assim fosse.
O bandido que tinha a arma era o mais impaciente, estava nervoso e suava que nem um porco.
Cala-te, caralho! – gritava ele.
Voltei a repetir as mesmas palavras, agora em voz mais alta e levei outro murro na cara.
Depressa a sua atenção se virou para a bolsinha de veludo que continha os diamantes, o seu companheiro contava as pedrinhas, uma a uma, como se soubesse aquilo que iria encontrar e se faltava alguma.
Esta noite estava longe de terminar e pressentia que não fosse acabar da melhor maneira.
Não imaginava o que mais aqueles dois pudessem querer de nós, talvez uma foda na Patrícia, com um corpinho daqueles e uma carinha linda, até o Papa lhe haveria de querer saltar para cima. No entanto, ela parecia-me calma e bastante serena, quase sorridente e despreocupada, contrastando bastante com o meu ar cada vez mais apreensivo.
Senti novamente a leve vibração na coxa, a chamada tinha sido interrompida, desta vez ao fim de largos minutos. Os meus amigos estariam a pouco mais de dez minutos dali, vindo de carro e depressa.
Olhei para a Patrícia e sussurrei-lhe o que tinha feito, enquanto os bandidos se regalavam a contar pedrinhas preciosas. Ela esboçou um semblante de preocupação e ficou um pouco apreensiva, depositava poucas esperanças nas capacidades dos meus amigos.
Restava-nos agora esperar...
Não aguentava mais aquele impasse, eles limitavam a manter-nos ali retidos e pouco mais faziam que olharem para nós, talvez estivessem a imaginar uma maneira de nos matar mas era improvável, se nos quisessem mortos, já o teriam feito.
O bandido mais reservado nas palavras, olhou-me nos olhos e franziu os seus.
Chegou-se perto da minha cadeira e apoiou-se no meu ombro.
Como queres morrer?... Bala na cabeça ou no coração? – perguntou ele, sarcasticamente.
Esperem...
Certamente há maneiras melhores e mais limpas de se resolver isto.
Posso primeiro saber quem vocês são?
– dizia eu, antevendo o meu fim.
Somos os gerentes da ourivesaria que vocês roubaram. Estás recordado?
Aqui a tua amiga fez um excelente trabalho, pena não ter cumprido com o plano.
Felizmente para o seguro chega, espero que a polícia vá na mesma história.
– acrescentou ele.
Não podia acreditar naquilo, afinal tudo fazia parte de um esquema bem montado.
Vocês têm os diamantes e a polícia pensa que foi um roubo vulgar.
Nós não diremos nada a ninguém, têm a minha palavra.
– pedia eu que nos poupassem.
A Patrícia permanecia calada, tinha sido ela a meter-me nesta trapalhada toda mas era incapaz de lhe guardar qualquer ressentimento. Tinha feito o que achei apropriado na altura devida e voltaria a passar por tudo novamente, por paixão a esta mulher. Passámos momentos mágicos juntos, vivíamos agora a fantasia do fim das nossas vidas.
O dono da ourivesaria apresentou-se a mim como Marco, estava agora mais falador que no inicio.
Porque não perguntas à tua amiga Patrícia porque estás aí sentado agora...
Tudo isto foi ideia inicial dela, inclusive eliminar as pontas soltas, neste caso tu.

Aquela afirmação dele intrigou-me bastante.
Se aquilo fosse verdade, tudo o que tinha vivido com a Patrícia não passaria de mais um esquema.
Não ligues, João. Ele está a tentar colocar-te contra mim.
Sabes que eu te adoro e nunca te faria uma coisa dessas.
– disse a Patrícia.
Sinceramente não sabia em quem acreditar, o meu coração pesava para o lado de quem gostava mas a razão apontava com todas as forças para o filho da puta do bandido.
Miúdo, acredita no que quiseres.
Foste fodido de todas as maneiras possíveis.
Se estás nessa cadeira foi porque ela quis.
– dizia o Marco.
É tudo mentira, João! Eu amo-te. – interrompia ela.
Não te preocupes miúdo, ela vai-te fazer companhia nos anjinhos. A quantidade de diamantes que ela me desviou, pagou-lhe um bilhete de ida para o céu. – finalizava o bandido, com uma gargalhada.
O gajo deu uns passos na direcção da Patrícia e começou a questioná-la sobre o paradeiro de alguns diamantes que faltavam na bolsinha. Ele estava a ser bruto mas o meu coração já não batia da mesma maneira por ela e o sofrimento dela, na altura que ele lhe arrancava a informação à porrada, era-me agora indiferente.
Onde é que os meteste, minha cabra?
Engoliste-os foi? Agora só deixas de comer na tromba quando os cagares.
– gritava ele.
O ambiente era de cortar à faca, estes tipos não estavam ali para brincadeiras.
Vamos lá ver se a tua amiga afinal gosta de ti... – disse ele, agarrando na pistola.
Apontou-me a arma à cabeça e perguntou-lhe novamente onde tinha escondido os diamantes.
Se tinha sido ela a sugerir que me eliminassem, não seria agora que ela faria qualquer coisa para me salvar.
Sabia que aquele seria o meu momento final, rodei o pescoço na direcção da Patrícia e fixei os meus olhos nos dela, soprei-lhe um beijo e sorri uma última vez para aquela carinha linda.
Está tudo fodido! – alguém gritava, vindo do outro lado da fábrica.
Olhámos todos na sua direcção e nem quis acreditar no que os meus olhos viam, era o Alexandre a correr que nem um maluco e com um barrote das obras na mão.
Alex, pára! – gritei eu, vendo o bandido com a arma.
O Marco não esboçou qualquer sinal de intimidação, apontou a pistola na direcção do Alexandre.
Foda-se! Onde é que eu me vim meter?! – exclamou o Alexandre.
O meu amigo apercebeu-se da gravidade da situação, largou o barrote, deu meia volta e tentou fugir na direcção oposta à da pistola mas era tarde demais, o filho da puta do Marco disparou e acertou-lhe com um tiro.
Ele gritou como o caralho e caiu desamparado no chão.
Os dois sócios começaram a questionar-se como é que o Alexandre tinha ido ali parar.
Cercaram-me e revistaram os meus bolsos, recolheram o telemóvel e viram a hora da última chamada efectuada. Pela primeira vez, eles entraram em pânico, ficaram assustados com a possível chegada da polícia, a qualquer momento.
Descarregaram a sua revolta em mim, encheram-me de porrada até a cadeira tombar violentamente no chão, partindo um dos suportes. Sangrava um pouco do nariz e doía-me o estômago.
O Alexandre não tinha carta e muito menos carro para chegar até aqui, deve ter vindo com o Zé.
O Zé ainda não tinha dado sinais de vida, talvez fosse melhor assim, era menos uma desgraça.
Um dos bandidos foi fazer uma vistoria ao entulho que se encontrava amontoado no lado de onde o Alexandre tinha vindo a correr, levou consigo a pistola. O gajo foi lá ver se havia mais alguém, devido à fraca luminosidade, teve de atravessar todo o entulho para ver o que se encontrava do lado de lá.
Ele não mais voltou, não tinha havido qualquer barulho e não fazia a mínima ideia porque ele estava a demorar tanto para vasculhar num monte de despojos. O Marco, mais calculista, ficou intrigado com a longa demora do seu sócio e começou a gritar em todas as direcções.
Não havia qualquer resposta do lado de lá, o outro tinha desaparecido na escuridão que se fazia mais sentir para lá do entulho, ali a menos de vinte metros. Esperava que este súbito desaparecimento de um dos bandidos tivesse sido obra do Zé, tendo assim passado para o nosso lado a única arma existente no local.
Olhei de baixo para o ar preocupado do Marco, este via agora o seu plano a ir por água abaixo.
Eu continuava amarrado a uma cadeira, agora quebrada, e ele aproveitou-se disso para me dar pontapés. Fiquei-lhe com uma raiva desgraçada, era cobarde da parte dele descarregar as suas frustrações num homem sem hipótese de defesa.
Ao lado, ainda sentada na cadeira, a bela Patrícia levava chapadas na cara.
Tentava procurar o Alexandre no chão da fábrica, era capaz de jurar que ele tinha caído exactamente no sítio para onde olhava naquele momento mas o corpo já não estava lá, tinha certamente sido removido. Esperava a qualquer momento por uma acção rápida da parte dos meus amigos. O bandido que faltava abater estava desarmado e pouco mais fazia que espancar vítimas amarradas.
O momento da verdade era agora, o Zé saiu da escuridão do entulho, com a arma em punho, e mandou o cabrão do Marco levantar as patas no ar, este obedeceu ou sabia que levava um tiro.
Dois passos atrás de si, para minha grande surpresa, vinham a irmã da Patrícia e o Luizinho.
Diana dirigiu-se na nossa direcção e desapertou os apertados nós que nos amarravam às cadeiras enquanto que o Luizinho queria mostrar serviço e foi encher o bandido de porrada, todo o seu treino durante anos seguidos em kick boxing tinha agora a sua utilidade.
Levantei-me do chão, peguei num dos paus partidos que pertenciam à minha cadeira e dei uma bastonada com toda a força na tromba do Marco, aquele bandido filho da puta pagava agora o mal que me fez.
O gajo caiu inconsciente no chão e o Zé baixou a arma.
Que é feito do outro cabrão? – perguntei eu.
Está a dormir atrás daquele monte ali... levou com um tijolo nos cornos. – respondeu o Luizinho, todo contente.
O teu amigo Alexandre está só desmaiado, a bala perfurou-lhe uma nádega. – acrescentou a Diana.
Fiquei mais descansado com esta boa noticia e deixei-me rir sabendo que ele tinha levado um tiro no cú.
Nem tudo estava resolvido, a Patrícia queria levar a sua ideia suicida avante e estava disposta a tudo.
Tirou a arma da mão do Zé e pegou na bolsa dos diamantes, queria fugir antes que a polícia chegasse mas tinha agora pouco tempo, ouvia-se o som das primeiras sirenes da polícia a aproximar-se da fábrica onde estávamos.
Mana, larga isso e podemos sair daqui calmamente. – insistia a Diana.
Isto deixou de me importar... Não me interessa mais.
Não vês que tudo acabou para mim?
– disse ela, caindo-lhe uma lágrima pelo rosto.
Nada disso, linda. Escuta a tua irmã e havemos de arranjar uma solução. – acrescentei eu.
Patrícia olhou em seu redor e calmamente pousou a arma no chão, tal como a bolsinha dos diamantes, andou na direcção da irmã e abraçou-a, como se fosse o último contacto das suas vidas. Era um momento triste, decidi esquecer que tinha sido vítima de um esquema bem montado para me levar a fazer um trabalho sujo e quis acreditar que no fundo ela gostava um pouco de mim.
Aproximei-me das irmãs e juntei-me ao abraço delas, roubei a atenção da Patrícia para mim e demos um longo beijo nos lábios, em memória dos bons momentos passados nos últimos dias.
Sem ressentimentos. Agora tens de ir... vai. – disse-lhe eu, em tom de despedida.
Ela deu um beijo na irmã e soprou outro para mim.
Patrícia desaparecia agora na escuridão da noite, fiquei visivelmente emocionado e não consegui conter as lágrimas, abracei a Diana e esperámos pela chegada da polícia que pouco tempo mais demorou.
O Zé tratou de tudo ali no momento, eu estava exausto e devido ao pai do Zé ser chefe duma esquadra no Barreiro, tive permissão para ir directo para casa e apresentar-me no dia seguinte nessa mesma esquadra.
Cheguei a casa, dorido e emocionalmente afectado, despi as roupas sujas de sangue e meti-me na cama.
Não conseguia adormecer, todos os acontecimentos daquela noite eram revividos vezes sem conta na minha cabeça e um enorme sentimento de saudade apoderava-se de mim, sentia a falta dos calorosos beijos da Patrícia... e o que haveria de ser dela agora, no fundo era mais uma vítima como eu.
Tentei abstrair-me do mundo em que vivia e entrar no dos sonhos, um vasto mundo de fantasia onde nada daquelas merdas aconteciam.
Era finalmente hora de dormir, suspirei uma vez mais e fechei os olhos até adormecer.